‘Ninguém merece ser discriminado’

julho 15, 2022

Lázaro Ramos fala sobre a estreia como diretor, a carreira no cinema e na TV, casamento e da luta por um país igualitário

Ele é ator, roteirista, produtor, dublador, apresentador, escritor e agora diretor. A longa lista de títulos ostentada por Lázaro Ramos reflete, com muita propriedade, sua competência. Aos 10 anos, já se destacava em pequenos trabalhos para o teatro usando o nome artístico Lula Somar,  jogo de palavras improvisado com as iniciais de seu nome, Luís Lázaro Sacramento de Araújo Ramos. A consagração veio em 2002, com o filme “Madame Satã”, remake do clássico estrelado por Milton Gonçalves em 1974. De lá pra cá, nunca mais parou de brilhar. Como escritor, Lázaro publicou seis títulos, sendo cinco para crianças e um para o público adulto. Ele se prepara para lançar o sétimo livro, voltado agora ao público adolescente, como antecipado por NEW MAG. O longa “Medida provisória”, que marca sua estreia como diretor, vai muito bem, obrigado. Sucesso de bilheteria no cinema, ele também pode ser assistido no Globoplay, onde chega com exclusividade nesta sexta-feira (15). Neste bate-papo, Lázaro Ramos fala sobre carreira, casamento, projetos futuros e sua incansável luta contra o racismo.

Você está estreando como diretor, com o filme “Medida Provisória”, que vem recebendo excelentes críticas do público e que reflete bastante sua visão sobre o racismo no país. Na sua opinião, por que no Brasil, com uma população tão miscigenada, uma raiz negra tão forte, ainda temos que lutar contra essas questões? Por que ainda não conseguimos virar essa página?

Nossa, eu queria ter uma resposta simples para isso. Mas justamente por não ter uma resposta simples e nem exata sobre isso é que, nas minhas obras, vez por outra, falo sobre esse assunto, tentando convocar e conscientizar mais pessoas para a luta antirracista. Isso está presente no “Medida Provisória”, mas está na minha literatura infantil, nos seriados e nos filmes de comédia que faço. É sempre uma tentativa de ajudar a extirpar esse mal. O que eu sei é que é um mal terrível e que ninguém merece ser discriminado e passar por racismo. Aí a gente vai tentando usar a arte como porta de entrada para sensibilização.

Você é de uma geração que trouxe excelentes atores: Vladimir Brichta, Bruno Garcia e tantos outros. Como você vê o legado da sua geração para a cultura do país?

Acho que a minha geração está colhendo os frutos de gerações anteriores. Não há como falar da minha trajetória sem falar de Milton Gonçalves. Não há como falar de Wagner (Moura) sem falar de Otton Bastos. Não há como falar de Vladimir Brichta sem falar de Regina Dourado. Isso para citar alguns atores que são referência para nós e que construíram uma história que foi uma abertura de caminho. Acho que a gente chega num momento onde, principalmente o cinema, estava olhando para um tipo de brasileiro que não estava ocupando as telas até então. Aí Wagner vai ali para o “Deus é brasileiro”, eu vou para o “Madame Satã”, “O homem que copiava”, “O homem do ano”… E a gente vai construindo uma trajetória de atores que poderiam ficar estereotipados em um só tipo de personagem pela região de onde vêm e damos uma volta no raciocínio vigente para ter a possibilidade de contar várias histórias, independentemente dos nossos traços físicos e características regionais. Isso é uma coisa da qual eu me orgulho muito, sou muito feliz e luto até hoje para manter, ter uma carreira de diversidade, falando sobre vários assuntos e ocupando vários lugares.

Por falar em Milton Gonçalves, lamentavelmente tivemos essa perda recentemente desse ator que foi pioneiro, um dos primeiros atores negros a conseguir destaque e reconhecimento na profissão. Analisando os dias de hoje, o que mais é preciso conquistar para reforçar o protagonismo do negro?

Continua sendo o mesmo discurso, de diversidade de personagens e de histórias. É uma meta. E trabalhar constantemente, o que é muito importante para a carreira de qualquer ator e não seria diferente para nós, atores negros.

Você fez diversos trabalhos na Rede Globo e agora está na Amazon Prime para acumular vários papéis importantes por trás das câmeras. Como está sendo essa nova fase da sua carreira?

Sabe quando você diz assim: “eu sonho com isso” e, aí, quando o sonho chega, você vê que não basta sonhar, que tem muito trabalho também? É um pouco assim que eu estou me sentindo. Estou feliz pela possibilidade de escolher as histórias que vou contar, de estar ocupando um lugar de direção, de roteiro, mas é uma grande responsabilidade porque é um espaço inédito na minha vida, e eu estou aprendendo a fazer, me dedicando muito, mas muito consciente de que é uma grande responsabilidade. A rotina virou outra, de ocupações e carga horária muito maiores do que tive na minha vida até então. Mas não estou reclamando, não. Alguém disse isso: “sucesso só vem antes de trabalho no dicionário”. E não é mesmo?

Um casamento de tantos anos com Taís Araújo e uma profunda parceria profissional. Como é que vocês lidam com essa rotina de marido, mulher, diretor, atriz, produtor?

Não tem essa separação, não. De vez em quando perguntam isso, e a gente até criava uma resposta poética, mas a verdade é que é tudo misturado, e a gente, de alguma maneira nesse caos, consegue se organizar e ser feliz assim. Acho que a gente nem sabe mais ser de outro jeito. A gente pode estar fazendo uma peça de teatro e conversando sobre a mensalidade escolar dos nossos filhos. Isso até alimenta o relacionamento, porque a gente não tem rotina.

Crédito da imagem: Júlia Rodrigues

 

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