Rita Lee (1947-2023) cantou, certa vez, que dondoca é uma espécie em extinção. E Antonia Mayrink Veiga Frering é prova disso. Filha de Tony (!930-2016)e de Carmen Mayrink Veiga (1927-2017), dois pilares de elegância na vida social do Rio de Janeiro, Antonia cresceu sob as regras das boas maneiras e conhece o que há de mais sofisticado em âmbitos que vão da gastronomia à decoração, passando pelo vestuário (segmento que fez de sua mãe um símbolo) e pelas artes, cujo interesse lhe foi despertado pelo pai. Casada com o empresário Guilherme Frering, Antonia morava em Londres quando encantou-se pelas artes cênicas, iniciando-se na profissão. A carreira é conciliada com outro talento recém-descoberto: o de influenciadora. “Estou sempre inventando algo”, conta ela ao NEW MAG. A novidade mais recente é um livro. “Carmen & Antonia – Duas gerações à mesa” foi provocado pela descoberta de um caderno com receitas de sua mãe e será lançado no dia 13 deste mês, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon. “Não se trata de um livro de ensinamentos pois não tenho a pretensão de ensinar nada ”, constata ela, por telefone, nesta entrevista, na qual fala de preconceitos, critica hábitos da vida moderna e fala pela primeira vez de uma promessa ligada à cura de uma doença por ela enfrentada. Antonia pode não ter a pretensão de ensinar, mas conhecimento não lhe falta.
O que te motivou a reavivar a ligação com sua mãe em livro?
Encontrei, tempos atrás, um caderno com receitas anotadas pela mamãe e isso me comoveu. A gênese do livro começou ali. Então farei um livro de receitas? Mais um? Acontece que uma das receitas era a de um cuscuz paulista da minha avó Mima (Maria de Lourdes Canto Solbiati), que é hoje apreciada também pelos meus filhos. E me dei conta de que são quatro gerações saboreando um mesmo prato. Acontece que estou sempre inventando algo, e o livro foi além das receitas e traz um pouco de memórias. Tenho comigo as louças que eram da mamãe, então falo um pouco de como ela recebia e como recebo meus amigos em casa. Há coisas do dia a dia e até dica de sanduíche. Não se trata de um livro de ensinamentos, pois não tenho a pretensão de ensinar nada, mas a de fazer um livro com ideias e impressões.
Você e sua filha trabalham e, na sociedade brasileira, romperam com o estigma da mulher rica e desocupada. Você colaborou também para mudar o pensamento da tua mãe, não?
Você sabe que mamãe começou a trabalhar por minha causa? Eu a incentivei muito a mudar de vida e, depois do livro lançado por ela (“Carmen de A a Z”), ela começou a fazer palestras e, tempos depois, colaborou para revistas. Chegamos a um ponto em que eu precisava cuidar dos meus filhos, que ainda eram pequenos e não podia dar a atenção que ela demandava. E ela precisava também ocupar a cabeça.
Muito se fala da Carmen, mas pergunto qual a lembrança mais latente que você traz do teu pai, Tony Mayrink Veiga?
Uma lembrança é a do doce de leite que ele adorava e comia todos os dias (risos). Papai era uma pessoa que prezava muito pelas amizades. Ele adorava música e fazia questão de ter uma aparelhagem de som de qualidade. Ele ajudou a moldar meu gosto musical. O que conheço de bossa nova veio através dele e posso dizer o mesmo sobre o Frank Sinatra, que ele adorava. Obrigada por me fazer falar dele.
A impressão que você passa é a de estar muito à vontade nos vídeos para o instagram. Como foi a descoberta da Antonia influenciadora?
Ela aconteceu de forma orgânica e essa espontaneidade vem do fato de eu ser atriz. E a atriz ajuda muito. Durante a pandemia, criei uma série de vídeos com dicas de séries e filmes. Eu me caracterizava e usava peças do acervo da mamãe, de acordo com cada tema. Era exaustivo, mas divertidíssimo. A ideia era a de apresentar aquilo durante um tempo e pronto, mas as pessoas amaram. Recebi mensagens dizendo que as pessoas esperavam a sexta-feira chegar para saber qual dica eu daria. Então, a influenciadora está aí e, nesse sentido, sou bem available: leio e respondo as mensagens quando tratam das questões abordadas.
Por ser uma mulher sofisticada, sofreu algum tipo de preconceito no Brasil ao abraçar a carreira de atriz?
Inúmeras vezes! E não somente no Brasil como no exterior, tá? “Você é sofisticada demais”, ouvi muitas vezes. Nossa! As pessoas de um modo geral se deixam intimidar pela sofisticação, o que é uma pena, como se fosse um defeito. Sigo em frente até porque só devo satisfações a duas criaturas: a Deus e ao meu marido. Nem aos meus filhos devo satisfação.
Você ajudou a fundar o instituto Desiderata, destinado ao combate do câncer infantojuvenil. O que te levou a se dedicar a esse tema especificamente?
Guilherme e eu visitamos, em Nova York, a ala pediátrica de um hospital oncológico. Havia ali equipamentos, profissionais qualificados e também tristeza e sofrimento. No almoço, trocamos ideias sobre a possibilidade de fazer algo diferente e veio dele a proposta de fazemos um instituto. O instituto é um lugar lúdico e voltado ao acolhimento. As primeiras ações foram ligadas à educação e fomos ampliando o leque. Recentemente adquirimos um tomógrafo e vou falar aqui algo que nunca disse antes: isso tem a ver com uma promessa que fiz durante o tratamento de um câncer.
Jura? E como você está hoje?
Estou ótima, graças a Deus, e você verá no lançamento.
Noto um aumento de contas no instagram com dicas de comportamento e de etiqueta… Como vê esse crescimento?
Vejo como algo positivo. Se está crescendo é porque há interesse naquilo. Agora, nem sempre concordo com o que é colocado como apropriado. O que é apresentado é uma opinião que não necessariamente pode ser a mesma que a minha.
Há uma tendência entre certas mulheres, moradoras da Barra da Tijuca, que é a de fazer um grupo para arrecadar fundos à compra de um presente a alguém daquele círculo que faça aniversário. O problema é que quem não colabora é constrangido. O que acha disso?
Você sabe que esse é o tema de um dos vídeos que gravei essa semana? Acho isso um horror. Antes de mais nada, ao criar um grupo, você precisa consultar se aquelas pessoas querem fazer parte dele. Esse é um ponto. O outro é: se esse grupo terá uma finalidade, essas mesmas pessoas precisam ser consultadas se querem ou não compactuar com aquilo. Dia desses, fui procurada por uma pessoa que queria colaborações para um presente e disse que já havia comprado algo à aniversariante. Assim é que deveria ser.
O que é elegância para você?
(Antonia fica um tempo em silêncio) Elegância tem a ver com o jeito de ser e não com uma norma. Elegância é você não se atrasar para um compromisso. É você não passar por cima dos outros. Ser discreta sem precisar se expor e isso é algo raro hoje em dia. Saber onde termina o seu direito e começa o do outro, e respeitar esse limite.
Crédito da imagem: Denise Leão