*por Rodrigo Fonseca
Apesar de o título sugerir traição, na lógica cultural latina, “O corno”, um dos 16 concorrentes à Concha de Ouro no 71. Festival de San Sebastián não fala sobre adultérios, e, sim, dos direitos das mulheres sobre seus corpos. A diretora Jaione Camborda, espanhola, vai ao passado, nos anos 1970, na fronteira entre seu país e Portugal, pra contar a fuga de uma parteira María (Janet Novás) que ajuda uma jovem a abortar.
A morte da moça faz de María um alvo da polícia, o que a obriga a sair de seu lar e buscar uma nova vida. A fotografia de Rui Poças amplia a potência estética da investigação social da cineasta, que teve o diretor luso Rodrigo Areias como seu produtor. Em entrevista ao NEW MAG em San Sebastián, Jaione fala sobre a luta contra o patriarcado.
Falar da Espanha da década de 1970 é tratar do regime ditatorial de Franco. De que forma o franquismo aparece como um fantasma em “O Corno”?
Não é uma aparição direta ou explícita, mas, sim, um perigo que ronda aquele mundo. Quis que o filme pudesse parecer algo estilisticamente próximo do presente, a fim de se conectar com questões contemporâneas sobre as proibições impostas ao corpo feminino.
Geograficamente, como essa analogia com o corpo se processa?
Há fronteiras em tudo, a começar pelos espaços, em limites culturais entre os territórios. Há fronteiras no corpo das mulheres também. Eu fiz o filme numa região que é cortada pelo Minho, na qual se entende o galego e o português, mas há um perigo imposto pelas armas, pela divisão do estado.
O filme denuncia violências contra as mulheres mas nuncas ridiculariza os homens. Como encontrar esse limite de sobriedade?
Era importante nunca satanizar o masculino. Foi só nunca enquadrar os homens no centro da narrativa. É um filme com mulheres em posto de protagonismo. Usei testemunhos reais para montar a narrativa.
*enviado especial ao Festival de San Sebastián
