Marcos Palmeira é um ator que cresceu aos olhos do público. O verbo não diz respeito ao sentido físico, mas profissional. Boa pinta, poderia estar resignado como galã, mas não, ele quer ir sempre além. E isso ficou provado, mais uma vez, com o Zé Leôncio de “Pantanal”, personagem originalmente interpretado por Claudio Marzo (1940-2015) e que, no remake, ganhou de Marcos novas matizes. Aprimorar-se é algo que ele coloca em prática em outros âmbitos. No campo profissional, volta a trabalhar com o pai, o diretor Zelito Viana, num projeto que o colocará num novo patamar: o de codiretor. Na vida pessoal, o ator está atento, há muito tempo, a pautas como Mudanças Climáticas e a alimentação saudável, que levou-o a produzir alimentos e a integrar o Instituto Brasil Orgânico. Os novos tempos reacendem nele a esperança de voltar a ver o Brasil fora do mapa da fome. “Somos o maior produtor de grãos, e o Brasil passa fome?”, questiona ao NEW MAG nesta entrevista, feita no Rio de Janeiro.
Você comoveu o país com o teu Zé Leôncio em “Pantanal”. Até que ponto o Zé Leôncio do Claudio Marzo foi um norte para a criação da sua personagem?
Acho que teve toda a minha relação com ele durante o período que a gente viveu lá no Pantanal 33 anos atrás. O Claudio sempre foi uma referência para mim como ator. Foi galã no Cinema Novo, um superator, um amigo querido da vida toda. Então, o trabalho acabou sendo feito para ele, ainda que essa nova versão tenha nos proporcionado um novo mergulho por ser uma obra fechada. A primeira versão era aberta, e a gente ia descobrindo o que ia acontecer na hora. Nesta nova versão, tínhamos começo, meio e o fim da obra, então ela trouxe mais camadas do que a primeira (versão), sem querer colocar uma como melhor do que a outra. As duas foram muito boas e deram muito certo.
Você volta à TV aberta este ano ou vai se dar um período sabático?
Para televisão não há nada de imediato, mas estou lançando uma série de ficção, “Era dos humanos”, sobre Meio Ambiente e Aquecimento Global, e volto a fazer cinema este ano. Começo a filmar em agosto, “Sedução”, com direção do Zelito Viana (pai de Marcos) e com a Dira Paes no elenco.
Você volta a trabalhar com teu pai depois de um longo hiato sem trabalharem juntos, não?
Volto a trabalhar com meu pai numa obra de ficção depois de muito tempo, uma vez que ele ficou sem filmar nesses últimos anos. Depois do Villa-Lobos (o longa “Villa-Lobos, uma vida de paixão”, de 2000) e do JK (“Bela noite para voar”, de 2009), fizemos recentemente o documentário “Da terra dos índios aos índios sem terra”, no qual vivo Darcy Ribeiro numa homenagem pelo seu centenário. As declarações do Darcy foram transcritas de uma entrevista, e digo essas falas na primeira pessoa, como se fosse ele. Esse trabalho está no Globoplay.
Muitas obras são lançadas hoje primeiramente no streaming e depois é que chegam à TV aberta. Acha que essa tática ainda é uma tendência ou ela veio para ficar?
Acho que, para a TV Globo, foi muito acertada essa decisão de ter a Globoplay. Você tem a TV aberta com as novelas e as séries, e o Globoplay, no streaming, podendo relançar e refazer coisas. Talvez a tendência seja a de, no futuro, ele se juntar à Amazon, à Netflix ou, de repente, ao HBO. Acho que quem ganha é o telespectador que tem uma gama de opções. Acho que o Globoplay leva uma vantagem por ter muito material, feito há muitos anos, com uma produção muito caprichada. Então, se a Globo quiser desmembrar qualquer produto e colocar no Globoplay, leva uma vantagem bem grande.
Tem vontade de seguir os passos do teu pai e dirigir cinema?
Nesse longa (“Sedução”) serei codiretor. Como meu pai é um ótimo diretor, brinco que vou só organizar a casa para ele fazer o trabalho do jeito que quiser. Meu papel será também o de dar a ele o apoio sentimental, de estar junto com ele no momento da filmagem. Mas eu tenho vontade, sim, de dirigir e estou com algumas ideias para desenvolver. Tenho vontade de voltar ao teatro e estou procurando um texto para fazer. Vamos ver.
Você milita há muitos anos pela alimentação consciente e saudável, sendo um produtor de orgânicos. Você acha que os novos tempos podem ajudar a conscientizar a população por um planeta mais sustentável?
Você ter uma pessoa como a Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente, a Sonia Guajajara nos Povos Originários e a Joenia Wapichana na presidência da Funai significa um sopro de esperança muito grande. A gente nunca teve tanta força nesse canal relacionado ao Meio Ambiente. A gente sai de um momento turbulento e totalmente distante do conceito de civilidade e volta a um momento no qual as pessoas podem respirar e ter de aceitar as divergências. É impressionante você pensar que, nos últimos quatro anos, as conversas davam-se no âmbito do combate e do estresse, com as pessoas tendo vergonha de falar bem dos outros, de elogiar. Acho que, agora, esses novos ares facilitam, mas ainda estamos longe de entender o Brasil como um grande celeiro de alimentos orgânicos. Temos ainda um longo caminho neste sentido.
Como vê iniciativas como a do Instituto Brasil Orgânico, ao qual você é ligado?
O Instituto Brasil Orgânico, do qual sou conselheiro e a Bela Gil, presidente, diz respeito a tudo o que é orgânico no Brasil. É um instituto com pesquisadores, agrônomos, biólogos e consumidores. A pessoa que acessar o site vai ter informações relacionadas a o que é um produto orgânico, quem o produz, como é essa questão no Congresso e o que há relacionado à legislação. Trata-se de uma ferramenta nova, mas que tem grande potencial de crescimento. Para mim é como se fosse um ministério dentro da Sociedade Civil.
É possível retirarmos mais uma vez o país do mapa da fome e sanarmos essa questão de uma vez por todas?
Acho que a gente deve e quero ver quem é que vai furar essa bolha. O Brasil é o maior produtor de carne do mundo, ou de proteína animal, como chamam agora, e o país passa fome? Somos o maior produtor de grãos, e o Brasil passa fome? Então, há uma incoerência nesse discurso, e as pessoas não se dão conta. “Ah, o Brasil é o maior produtor de soja”, mas você come soja na sua casa? Há a produção de milho, bastante usado para fazer ração, mas há também uma conta que não está sendo feita. Faltam ainda políticas claras, feitas por pessoas com algum entendimento (sobre o assunto), mas estou bastante esperançoso.