por Rodrigo Fonseca*
Cria do Andaraí, Leonardo Martinelli regressa de Cannes com a experiência de ter apresentado às plateias europeias uma outra visão do carnaval do Rio — numa toada mística e existencialista — que foca na folia dos blocos de rua. “Samba infinito”, o novo filme do diretor, concorreu na Semana da Crítica, uma seção paralela à briga pela Palma de Ouro. Entre as múltiplas atrações de sua produção, destaca-se a presença de Gilberto Gil no elenco, numa participação como ator. Camila Pitanga é outro tesouro desse experimento coberto de confete e serpentina.
Vencedor da competição Pardi di Domani do Festival de Locarno com o musical “Fantasma neon” (2021), Martinelli escalou Alexandre Amador como protagonista de “Samba infinito”, rodado com apoio da RioFilme, CNC e France Télévisions. A fita marca a estreia do jovem ator Miguel Leonardo. A trama se desenrola durante a folia de Momo do Rio de Janeiro. Em paralelo à chuva de confete e serpentina, um gari enfrenta o luto pela perda da irmã enquanto cumpre as suas obrigações de trabalho. Em meio à alegria dos blocos de rua, ele encontra uma criança perdida e decide ajudá-la. O encontro deflagra fricções entre lembranças e imaginação. Aplaudido na Europa antes também com “Pássaro memória” (2023), Martinelli explica nesta entrevista ao NEW MAG como foram seus dias pela Croisette.
Qual é o teu Rio de Janeiro de berço e qual Rio você leva às telas de Cannes?
Cresci e vivo no Andaraí, início da Zona Norte do Rio de Janeiro. É um bairro pouco mencionado, muitas vezes chamado de Grande Tijuca. Aqui costuma ter o que chamavam de Cinelândia da Zona Norte, tempos atrás. Infelizmente não há mais cinemas de rua por lá, mas a vontade de fazer filmes e mostrar uma visão particular sobre as ruas ao meu redor ainda é forte. É uma felicidade poder apresentar em Cannes uma visão sobre como podemos habitar as ruas da nossa cidade.
Que aprendizado você traz de Locarno para Cannes?
Locarno foi o primeiro grande festival internacional de que participei e ele acolheu-me, abrindo inúmeras portas para mim. Sou muito grato a eles por darem espaços e destaque a novos talentos. De lá, trago os seguintes aprendizados: O primeiro, o cinema sempre pode ser e será mais do que a gente espera. Sejamos abertos a novas formas, linguagem, sons, contradições…; o segundo, pegue seu ingresso logo! e por último, não deixe de comer entre uma sessão e outra.
Como Cannes está se desenhando para você e o que já viu de mais potente?
É uma experiência mais intensa do que imaginei. Tem realmente tanta coisa acontecendo que se você se deixa levar, passa o dia em jejum. Então o festival para mim se desenha como uma experiência tanto emocional quanto física. E festival é sempre uma arte do encontro. Desde antigos parceiros do Brasil, até cruzar na rua com o Jeremy Strong ou esbarrar com o Michael Cera em um coquetel. Adorei assistir a todos os curtas que nos acompanharam na Semaine de la Critique. Dois filmes especialmente fantásticos são “God is shy“, de Jocelyn Charles, e o longa tailandês ganhador da seção, “A useful ghost“.
* enviado especial ao Festival de Cannes
Crédito das imagens: divulgação
