O diretor André Heller-Lopes é um profundo conhecedor de óperas, certo? O que o público que acompanha sua trajetória desconhece é que ele tem uma relação afetiva com algumas características basilares da nossa Cultura. E elas ficarão (bem) evidentes na montagem assinada por ele de “A viúva alegre”. A opereta estreia, nesta quinta (17) no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Símbolo da nossa brasilidade, Carmen Miranda (1909-1955) é homenageada na montagem – e não somente ela. Dercy Gonçalves (1907-2008) e Zé Trindade (1915-1990), célebres representantes das nossas chanchadas, estão presentes também no espetáculo, que pode ser visto na cidade até o dia 27 deste mês.
A concepção da montagem surgiu a partir de um convite para dirigir a opereta na Estônia com um detalhe desafiador: ela seria cantada também no idioma daquele país. Como a trama se passa num país fictício – e falido – dos Balcãs, André incrementou à narrativa um quê da nossa latinidade. E ninguém melhor do que Carmen Miranda, cuja morte completa oito décadas este ano.
– Uma vez que a ópera é ambientada num país falido, optei por trazer este lugar à América Latina, como se fosse uma República das Bananas, um ambiente fictício no melhor estilo dos filmes da Carmen, cuja figura nunca sabemos se é brasileira, mexicana, peruana ou o quê – pontua o diretor, que resolveu ir um pouco mais além na versão apresentada no Brasil.
Sim. O segundo ato é ambientado numa grande festa promovida por Hanna, a tal viúva do título. E passam pelo salão outras divas do cinema dos anos 1930 como Rita Hayworth (1918-1987) e Veronica Lake (1922-1973), para darmos dois exemplos. E por que não ambientar essa festa num local que fez história no Rio de Janeiro entre 1933 e 1946?
– Como o segundo ato se passa numa grande festa, optei pelo fato de a personagem recriar em Paris o Cassino da Urca, com suas arquibancadas que conhecemos reproduzidas no cenário. A partir disso, quis também homenagear os nossos, como os personagens das nossas chanchadas. E por que não a dupla Zé Trindade e Dercy Gonçalves? – propõe André, que convidou Alice Borges para personificar nossa grande comediante. – O Barão Uzeda tem trejeitos que lembram os do Zé Trindade e, no caso da Dercy, escolhi a Alice Borges, uma atriz de teatro e que já havia interpretado a Dercy, inclusive.
A tal Viúva, pelo visto, não é Alegre somete no título. Ela é, neste caso, brasileiríssima. Então, como gritariam as coristas do nosso Teatro de Revista, “oba!”
Créditos: Christovam de Chevalier (texto) e Daniel Ebendinger (imagens)
