‘A passagem do tempo é fascinante’

fevereiro 14, 2025

Eduardo Moscovis brilha nos palcos e celebra parcerias, avalia escolhas e confessa que não se achava à altura do Petruchio, um de seus grandes papéis na TV

Eduardo Moscovis foi a primeira pessoa da sua família a abraçar a profissão de ator. Desde sua estreia em “O Ateneu”, ele foi construindo seus papéis com a mesma gana com que forjou o artista que é. E, aos 56 anos, firma-se como um dos atores mais respeitados da sua geração. E dá uma prova disso no teatro. Du, como é chamado pelos amigos, expõe sua versatilidade em “Duetos”, comédia do britânico Peter Quilter na qual tem a alegria de contracenar com Patricya Travassos. A peça voltou a São Paulo, mais exatamente ao Teatro Faap e, em março, retorna ao Rio de Janeiro. “Uma coisa que os amigos comentam é de como a gente funciona juntos”, celebra o ator que coleciona parcerias nos palcos e nas telas, com nomes que vão da grande Ana Lúcia Torre a Carmen Maura, musa de Almodóvar. Em entrevista ao NEW MAG, o ator fala, por telefone, de escolhas pessoais, como a que levou-o a afastar-se por um tempo das novelas, das vantagens da maturidade e confessa que não se achava à altura do Petruchio, de  “O Cravo e a Rosa”, um de seus papéis mais marcantes na TV. “Sou dedicado, esforçado e tive também muita sorte”, pontua. A sorte também é nossa.

A sua sintonia com a Patrícia é latente. O quadro no qual vocês vivem dois irmãos é tocante. O que é mais gostoso no jogo que se estabelece entre vocês?

Venho de um teatro calcado na pesquisa e esse projeto é a primeira comédia assumidamente falando que faço no teatro. Ele tem ainda outra peculiaridade: é a primeira vez que entro num projeto já iniciado, uma vez que faço uma substituição (do ator Marcelo Farias). Quando o Neco (o diretor Ernesto Piccolo) me convidou, fez a ressalva: “quero que vocês sejam felizes e não existe outro propósito”, e isso de fato acontece. A Patricya é a Patricya Travassos, né? É aquela atriz que traz consigo uma bagagem que vem lá do Asdrúbal (Trouxe o Trombone) e que tem essa loucura do teatro. Uma coisa que os amigos comentam é de como a gente funciona juntos. Eu to feliz e acho que ela também.

Outra parceira marcante de cena foi Ana Lucia Torre. O que um ator precisa ter para você querer trabalhar com ele?

Tive oportunidade de trabalhar com a Ana Lúcia em momentos diferentes e todos eles foram de muito aprendizado. Na TV, fizemos “O cravo e a rosa” e, no teatro, trabalhamos em “Eles não usam black-tie”, “Norma” e em “Tartufo”, sendo que com “Norma” e “Tartufo” viajamos com cada uma das peças por um ano e meio. A forma como ela estuda, prepara a personagem e se apresenta é impressionante. A Ana Lúcia é uma referência de atriz, de uma certeza absoluta daquilo que se propõe a fazer.

O Petruchio mostrou ao grande público um ator pleno de possibilidades. O fato de ser um personagem que veio do teatro influiu para essa abertura?

Não me achava um ator à altura do Petruchio Achava-me pequeno fisicamente e emocionalmente para ele. E a (figurinista) Beth Filipecki foi fundamental, e fomos construindo o personagem juntos. Mesmo barbudo e com o cabelo grande, achava ainda que faltava algo, e veio dela a ideia daquele casacão que deu ao personagem um peso. Como o personagem trabalhava ao sol, outra ideia foi a de deixar mais claros alguns fios do cabelo. Outro alicerce foi o (Walter) Avancini,que estava voltando à Globo. Ele era um diretor muito cirúrgico e minucioso. “Não faça graça. Ela tem de estar na situação e não em você”, ele dizia. O Petrúchio era tosco e não sabia lidar com afeto. Ele se entende com a Catarina (personagem de Adriana Esteves) porque ambos eram resilientes nos seus posicionamentos.

E a novela fez um sucesso estrondoso e inesperado…

A novela era para ter em torno de 120 capítulos e chegou a 140, depois a 160 e terminou com 221 capítulos.

Chay Sued disse que Adriana Esteves gosta de improvisar para manter o frescor da atuação. Foi assim no Cravo?

A Adriana tinha acabado de ser mãe quando começaram as preparações. Ela estava amamentando e lembro de ela estar muito mexida com a maternidade. Do “Cravo” para cá passaram-se 25 anos! Ela tem agora 25 anos a mais de estrada e só fez crescer como atriz. Nunca mais trabalhamos juntos e, quando isso acontecer, será uma experiência nova.

Você ficou um bom tempo afastado das novelas… A decisão foi importante no teu aprimoramento pessoal e artístico?

Tenho um tipo que funciona bem para a indústria televisiva e fui catapultado para a TV.Por outro lado,a TV pode te engessar e cabia a mim tomar as minhas rédeas. Quando não renovei meu contrato, foi uma atitude pensada e me organizei financeiramente para isso. Já havia TV a cabo e senti vontade de experimentar mais, o que foi importante para mim. E quando retornei à TV, voltei com medo de fazer, o que foi ótimo (risos).

Você teve oportunidade de trabalhar com grandes nomes… Algum deles te emociona em especial?

Fui o primeiro cara da minha família a trabalhar como ator. Não tenho muitos ídolos, mas  fiquei muito mexido com a morte do Ney (Latorraca). Quando soube, fiquei muito triste. Trabalhamos juntos na TV, fiquei ligado a ele e fiz questão de ir ao velório. Ele tinha aquele jeito brincalhão, mas era muito rigoroso com o próprio trabalho.

Você foi filho do Paulo José em “Por amor”… Qual o maior aprendizado obtido com ele?

Trabalhamos juntos em 1989, num espetáculo para celebrar os 200 anos da Revolução Francesa. Era um projeto audacioso, na Fundição Progresso, em que havia uma plataforma com palcos diferentes, por exemplo. O Paulo atuava e, por ser também diretor, acabou ajudando a solucionar várias questões da encenação. Nessa época, me aproximei da Bel (Kutner, filha do ator) e namoramos durante três anos e, por isso, convivi com ele em situações de família. O Paulo respirava arte com total naturalidade e falava do assunto sem ser pernóstico. Guardo um carinho muito grande por ele.

E você e Glória Menezes trabalharam na série “Louco por elas”. A Glória é boa de troca?

Glória é uma excelente parceira de trabalho, com uma disponibilidade artística imensa. E não somente ela. A Deborah (Secco) foi outra parceiraça, e a Luiza (Arraes) também. Admirava o João Falcão há um tempão, e a vontade de trabalhar com ele era antiga. Havíamos conversado sobre fazermos algo no teatro, marcamos um café e, no dia, ele avisou que os planos tinham mudado (risos) e veio com a ideia de fazermos algo na TV.

E como foi trabalhar com a Carmen Maura, musa de Almodóvar, no filme “Veneza”?

Foi muito tranquilo. O filme foi rodado em Montevidéu, ficamos no mesmo hotel e isso nos aproximou. Ela ficou encantada pelo jeito de o Miguel (Falabella,diretor do filme) trabalhar. A fé cênica e o domínio que ela tem da cena são impressionantes.

Como avalia o ator em que se transformou?

Não computo muito sobre isso. As coisas foram acontecendo e fui fazendo. Falamos aqui de um personagem que tem 25 anos. Do “Ateneu” para cá são 35 anos! O tempo passa assim num sopro! Sou dedicado, esforçado e tive também muita sorte e sou muito grato por isso.

Até que ponto a proximidade dos 60 te fascina ou te assusta?

Tudo é muito surpreendente. Hoje, me considero para lá do segundo ato (risos), e o entendimento dessa transição é muito importante. Não gostaria de perder o vigor e o entusiasmo. Um exemplo é o do Othon Bastos, que está aí. A passagem do tempo é algo fascinante e assustadora, e o fascínio está justamente aí.

Créditos: Christovam de Chavelier (texto) e Mario Canivello (imagem)

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