‘A era dos grandes nomes da música está acabando’

janeiro 10, 2025

Roberto Medina, idealizador do Rock in Rio, relembra episódios marcantes do festival, fala de novos planos e clama por mais investimento em Cultura e pela preservação do Planeta

Alguns sonhadores são visionários. E há os que correm atrás do sonho. É o caso de Roberto Medina. O publicitário tinha 38 anos quando, em 1985, realizou a primeira edição do Rock in Rio. Isso num país sem infraestrutura e know-how para receber o show de um grande astro internacional, quiçá um festival com mais de 20 atrações, sendo a metade delas do pop internacional. O que parecia delírio voltou a se repetir em 1991 e consolidou-se como um dos mais respeitados festivais de música do planeta. No ano em que a marca completa quatro décadas, sua história é contada em “Rock in Rio 40 anos – O musical”. A superprodução, criada e dirigida por Charles Möeller e Claudio Botelho, estreia neste sábado (11), na Cidade das Artes Bibi Ferreira, Barra da Tijuca, na mesma Zona Oeste onde o RIR estreou. Medina é interpretado por Rodrigo Pandolfo num personagem com um quê de Dom Quixote. “Realizamos um festival quando o país entrava na redemocratização e sem condições técnicas e estruturais”, reconhece Medina em entrevista ao NEW MAG. Na conversa, por telefone, ele lembra de perrengues envolvendo Prince (1958-2016) e os Guns n Roses (em edições distintas, é claro), revela um xodó por Frank Sinatra (1915-1998), critica o mundo hipertecnológico de hoje sem, contudo, deixar de ver a Inteligência Artificial (IA) como aliada. Mas é categórico: “A vida é ao vivo”.

Os 40 anos do Rock in Rio serão de fato comemorados com um musical com a grife Möeller e Botelho, dupla com a qual o senhor trabalhou em edições recentes do festival. Por que a opção por esse formato?

Você deve pensar como um cara que realiza um evento para milhões de pessoas se envolve agora com algo que será visto por mil pessoas a cada noite, mas é isso mesmo. O Rock in Rio é hoje a terceira marca preferida pelo público brasileiro. Claro que, num festival, as atrações são importantes, mas o que fica é o que o público guarda dele. A emoção e a interação do público são os mais importantes, e o teatro musical é um ótimo meio para contar essa história e levá-la às novas gerações. Meu personagem é associado ao Dom Quixote e isso tem muito a ver comigo. Realizamos um festival quando o país entrava na redemocratização e sem condições técnicas e estruturais para tanto. Ao fim da primeira edição, baixei no hospital. Tenho esse lado quixotesco e sou hoje um vira-lata orgulhoso.

Quais as situações mais bizarras com que precisou lidar em 40 anos de festival?

Foram duas. Uma envolve o Prince. Ele exigiu para o camarim 400 toalhas brancas, e fiz uma peregrinação pelos hotéis da Barra atrás de toalhas. Sabe quantas ele usou? TRÊS (risos)!

E qual a outra?

A outra envolveu os Guns n Roses. As TVs estavam proibidas de registrar a passagem de som deles, e a Globo  gravou. Em retaliação, eles disseram que não se apresentariam se a fita não fosse devolvida, e precisei recorrer ao Boni para resolver a questão.

O Boni fala no livro dele que foi da Globo a ideia de incluir Ivan Lins na noite que contou com o Taylor e o George Benson….

Lembro de receber o Ivan e o Benson numa festa na minha casa e de os dois se divertirem com o piano que comprei para o Frank Sinatra  (o cantor apresentou-se no Rio em 1980). Tenho verdadeiro xodó pelo Sinatra.

Conseguiu assistir a todos os shows da primeira edição do RIR?

Assisti a flashes. O do James Taylor foi um que fiz questão de assistir. Botei boné e óculos e fui para o meio do público. Vê-lo cantar com aquela lua imensa ao fundo foi inesquecível.

Hoje o Rio está na rota das superproduções e isso se deve muito ao seu pioneirismo. Como vê essa questão?

Há uma mentalidade que precisa ainda mudar: a de que Cultura não é um investimento e sim um gasto. E esse pensamento está muito arraigado na classe política e encontra eco em parte da imprensa. A Cultura precisa estar mais atrelada à vocação que a cidade tem de grande polo turístico. Estamos atrasados nessa matéria em relação a muitos outros países, vários deles da América Latina como o Uruguai.

Algum astro que gostaria de trazer ao RIR e que ainda não foi viável?

Todos já vieram. Até porque a era dos grandes nomes da música está acabando. Lembro do voto de confiança que o empresário do George Benson me deu antes da primeira edição. Ele disse que não assinaria contrato enquanto não tivesse garantias de que eu honraria com o que prometia, mas me permitiu usar o nome do Benson como certo no festival. Acabei cumprindo com tudo e ganhei o respeito dele. Essa situação é impensável hoje em dia.

Por falar em impensável, o senhor pegou a transição entre um mundo analógico e o altamente conectado. Lida bem com as novas tecnologias?

Tenho um lado analógico que preservo ainda. Gosto do livro e gosto do jornal. Tenho na agência conforto e faço um café ótimo, mas porque marco reunião no Starbucks? Para estar com as pessoas. Uma reunião de criação não pode acontecer com cada um atrás de uma telinha. A vida é ao vivo.

Pensa em utilizar recursos de Inteligência Artificial, como hologramas, nas próximas edições do RIR?

Penso que a inteligência artificial pode ser uma ferramenta favorável ao meu trabalho. Venho da Comunicação e sou do tempo em que a gente colava letrinha por letrinha num anúncio. Já usamos o recurso de identificação através da leitura da íris na área VIP, e penso que será possível usá-lo também com o público. Chegará o dia em que os convidados chegarão à área VIP em carros voadores. Por que não? Por ora estamos estudando a possibilidade de fazer um dragão voar sobre a plateia (risos).

O futuro te fascina ou angustia?

A capacidade de projetar o futuro vem de nós mesmos. E precisamos repensar o mundo de hoje. Estamos destruindo o nosso maior bem que é a Natureza. Esse mundo hipertecnológico acarreta em polarização, como vemos hoje, e em crianças e jovens ansiosos e angustiados. É isso que queremos? Este mundo não deu certo. As pessoas precisam das outras pessoas.

O que falta ainda realizar?

O projeto “Imagine”, um resort na área contígua à da Cidade do Rock. Meu plano é o de deixar esse legado perene, ao contrário do festival, que é sazonal, e que alie entretenimento, lazer, informação e tecnologia. A gente precisa disso? Essa foi a pergunta que ouvi quando do primeiro Rock in Rio. Corro atrás das ideias e quero entregar à cidade o que for possível. Vou que vou. Sou assim.

Crédito da imagem: divulgação

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