O Teatro Brasileiro tem em Dulcina de Moraes (1908-1996) um pilar importante para sua consolidação e para a profissionalização do ator. Não à toa, foi chamada por Fernanda Montenegro de “a maior personalidade das artes cênicas do século XX”. Com o marido, o empresário Odilon Azevedo, criou a companhia Dulcina-Odilon, uma das mais importantes do país. Com a morte do companheiro em 1966, muda-se, em 1972, para o Distrito Federal, onde passa a dar aulas na faculdade à qual deu seu nome, inaugurada em 1981. A atriz viveu no DF até sua morte, em 1996.
Pois bem, vinte seis anos após sua partida, relíquias deixadas pela atriz estão vindo à tona através do trabalho voluntário de cinco profissionais. Os itens, encaixotados, estão sob responsabilidade da Fundação Brasileira de Teatro (FTB). Em razão de equívocos administrativos nas gestões anteriores, o Ministério Público estabeleceu prazo de três anos para que um novo planejamento seja feito. O órgão começou, há seis meses, a abrir as caixas para a catalogação dos itens guardados.
Entre os bens descobertos estão peças de roupas (3 mil vestidos), prêmios, imagens históricas de montagens teatrais, fotos da atriz no dia a dia e bilhetes recebidos por Dulcina de grandes nomes como Fernanda Montenegro, Bibi Ferreira (1922-2019), Dina Sfat (1938-1989) e Clara Nunes (1942-1983).
O trabalho é executado de forma hercúlea. Um dos obstáculos está na falta de luz, pois o prédio onde estão as caixas, no Centro de Brasília, teve o fornecimento cortado no início da pandemia.
– As caixas são abertas com o interior iluminado por lanternas usadas pelos profissionais. Os itens são levados para uma sala no terceiro andar, onde há maior incidência de luz, para serem catalogados. Tudo está sendo feito com muita dificuldade – explica ao NEW MAG Josuel Junior, diretor do Centro Cultural FTB.
Alguns itens são de suma importância: a carteira de trabalho de Dulcina (que revela sua remuneração no ofício há mais de 70 anos), o diário escrito pela atriz entre 1977 e 1981 e um outro, escrito por Odilon Azevedo de 1920 a 1926. Há também uma carta para ele escrita pelo grande escritor Monteiro Lobato (1882-1948).
A atual gestão da FTB busca sensibilizar artistas e empresas para a importância do resgate desse patrimônio. Alguns nomes já se dispuseram a ajudar como Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg, grandes damas do Teatro como Dulcina. Mas a mobilização precisa ser maior, como reconhece Josuel:
– Todo esse material tem sido aberto, revelado, organizado e higienizado por uma equipe corajosa que entrou nos calabouços do prédio para garimpar o que poderia ser histórico para que nada mais se perca com o tempo.
E o tempo urge.