A Dama e o ‘Vagabundo’

janeiro 8, 2025

Joyce Moreno e Jards Macalé aliam canções e memórias em noite histórica e que reaviva tradição em teatro do Rio de Janeiro

O ano começou de fato. E com uma (bela) confraternização. Mais exatamente uma celebração da música e da amizade. E feita por dois de nossos grandes compositores e  ases no violão. São eles Joyce Moreno e Jards Macalé. A artista recebeu o amigo de longa data – e seu primeiro parceiro musical – na noite da última terça-feira (07), no Teatro Ipanema, reinaugurado como Rubens Corrêa. Os dois abriram  o Terças no Ipanema, projeto capitaneado por Flávia Souza Lima e que leva à casa a tradição de apresentações musicais.

Diante do teatro lotado, Joyce fez as honras da casa munida do seu violão e da voz cristalina. E esses dois instrumentos foram suficientes para ela arrebatar o público com temas ligados ao Rio (como “Salve a Natureza, de Paulinho da Viola) e clássicos autorais como “Mistérios” (num andamento mais sincopado) e “Monsieur Binot”, sendo calorosamente aplaudida pela cantora Simone,pela cantriz  Sandra Pêra e pela empresária Ana Basbaum, entre outros.

–  Quando o conheci, ele era muito estudioso. Tinha aulas de violão com Turíbio Santos e aprendia orquestração com Guerra Peixe. Natural que ele se tornasse o grande instrumentista e artista que é – saudou a anfitriã abrindo alas para Macalé surgir em cena.

–  Eu era estudioso pacas! Mas você se tornou uma violonista melhor do que eu, que sou um vagabundo – retribuiu o convidado, arriscando ainda uma definição ao (re) encontro: –  É a Dama e o Vagabundo.

Natural que os dois  rendessem tributos a alguns dos mestres que os formaram. E não faltaram confetes a Dorival Caymmi (1914-2008), de quem cantaram “Doralice”, e àquele que é um forte elo  entre eles: João Gilberto (1931-2019).

– Estava em casa, arrumando papéis durante a pandemia, quando encontrei anotado o telefone do João Gilberto! Esse número me foi dado com tantas recomendações que até esqueci que o tinha – contou o músico acrescentando que telefonou para o número: – Como João já havia morrido, me veio a questão: e se ele atender?

Joyce e Macalé: amizade e parceria longevas

Quem atendeu foi a secretária eletrônica, e Macalé prontamente deixou um recado pedindo ao mestre que retornasse a ligação quando a ouvisse. Poucos dias depois, veio a inspiração para um samba com forte pegada joãogilbertiana. “Olha ele aí”, atestou Macalé. Foi a deixa para a dupla apresentar “Um abraço do João”, que ganhou letra inspirada de Joyce.

E as reverências seguiram abraçando também talentos de fora da música, como Fernanda Torres, recém-agraciada com o Globo de Ouro e chamada por Joyce de “Nossa musa”. O nome da atriz veio à baila após Macalé lembrar que, dias antes, assistira a “Terra estrangeira”. No filme, Nanda canta sua “Vapor barato”,  imortalizada por Gal Costa (1945-2022) e um dos númros apresentados naquela noite por ele.

Às recordações juntaram-se um bem-humorado relato  de Joyce: Quando ela começou a flertar com a turma que viria a formar os Novos Baianos, ouviu do amigo a reprimenda:  “Cuidado que eles fumam maconha”.

– Jura que falei isso? – surpreendeu-se Macalé reconhecendo em seguida: – E hoje sou esse vagabundo. Como é que me tornei assim? Foi a MACONHA!

E a plateia respondeu entre gargalhadas e aplausos. Não só pela gaiatice em si, mas pela noite como um todo. Se Joyce reconhece-se hoje como a “Velha maluca” do samba com que  encerrou a noite, composto quando ela completou 70 anos, Macalé não fica atrás.

E, como na canção, viram coisas demais. E, juntos, compartilham no palco um pouco desse tanto que faz deles duas preciosidades da nossa música. O último a chegar ao Ipanema na próxima terça (14) é mulher do padre!

Crédito das imagens: Andrea Nestrea (fotos show) e Marcus Veras

Simone é recebida por Joyce e por Macalé no camarim

 

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