‘Não fiz muitos amigos na TV’

maio 24, 2024

Débora Falabella, que vive uma advogada no teatro, fala de como se protegeu do assédio, avalia a importância da Nina de "Avenida Brasil" e elogia Adriana Esteves e Marieta Severo

Débora Falabella já pode, aos 45 anos de idade, ser considerada uma grande atriz. E se faltava a credencial para tanto, ela foi conseguida com “Prima facie”, primeiro monólogo de sua carreira e no qual  interpreta uma advogada criminalista que revê sua relação com o ofício após sofrer uma violência sexual. A peça, em cartaz no Rio de Janeiro, é cheia de referências às leis e a estratégias de defesa, e Débora faz tudo soar natural e orgânico. E isso se dá pelo fato de estar por inteiro em cena, o que é uma de suas marcas. E a Mel de “O clone” e a Nina de “Avenida Brasil” são outros dois exemplos do quão aguerrida a atriz é. “Mudei minha alimentação e, nos dias de espetáculo, não tem essa de sair à noite”, conta ela ao NEW MAG, por telefone, corroborando seu comprometimento com o trabalho, no qual é mais uma vez dirigida por Yara de Novaes. Na entrevista, Débora falou de como se protegeu do assédio nos sets, comenta a importância de Nina na sua trajetória, rasga seda para Adriana Esteves e Marieta Severo e reconhece os benefícios da maturidade: “Hoje, me sinto muito mais dona da minha vida”.

Você encara seu primeiro monólogo com uma personagem densa num texto cheio de maneirismos do meio jurídico. Em algum momento pensou que não daria conta do recado?

Não que não fosse dar conta, mas, num dado momento, diante da seriedade do tema e das questões levantadas, eu me perguntei: “caramba, oque fui arrumar” (risos).  É um trabalho que me exige uma preparação física muito grande, quase como a de um atleta. Mudei minha alimentação e, nos dias de espetáculo, não tem essa de sair à noite, não.

Imagino que a preparação, que envolve a leitura de mesa, tenha sido longa, não?

Durou apenas quatro dias (risos).

Como assim?

Minto: durou uma semana mais ou menos. Quisemos ir logo para a ação, claro que a partir de uma preparação à qual eu já havia me submetido. E, sob esse aspecto, o trabalho da Yara acrescentou muito à criação do espetáculo, pela sensibilidade dela e pelo fato de já termos um entendimento uma da outra pelo fato de já trabalharmos  juntas há uns 20 anos. Outra colaboração importante foi a da Lu Góes que, por ser defensora pública, nos ajudou muito a entender as questões relacionadas às leis tão presentes no texto.

Já vivenciou nos bastidores da TV ou do cinema alguma situação em que precisou acender a luz vermelha e dar um basta?

Sempre mantive a luz vermelha ligada. Por ser mulher e por ser uma pessoa mais fechada, sempre mantive essa postura. Foi a forma que encontrei para me proteger. Nós, mulheres, passamos por constrangimentos o tempo todo. E agora que essas questões estão sendo faladas mais abertamente, olhamos para trás e percebemos como estivemos vulneráveis numa ou noutra situação. Os homens não têm isso de olhar para trás. Toda mulher já sofreu algum tipo de abuso.

A Nina é uma dessas personagens que entraram para a História da telenovela no país. O que ela trouxe de mais significativo para a atriz Debora Falabella?

Essa é uma pergunta difícil de responder… A Nina foi muito instigante por não ser uma personagem maniqueista. Durante algum tempo ela foi confunida com uma vilã, por ter momentos em que era perversa por trazer consigo aquele desejo de vingança, que vem da história dela. Outro fator importante era a relação dela com a Carminha (personagem de Adriana Esteves) e nosso entrosamento foi muito bom. Sem falar nos outros fatores trazidos pela novela, que tinha um texto muito bom e excelentes profissionais envolvidos ali.

A Adriana é uma atriz que cresceu aos olhos dos telespectadores. O que foi mais genuíno na troca de vocês?

A parceria da gente. Fazer uma novela não é fácil, você está sujeito a pressões de vários lados, internas e externas, então você precisa ficar muito firme em relação ao seu propósito. Adriana e eu ficamos amigas depois. Por ser mais reservada, tenho poucos amigos na TV.

Em “A dona da História” você interpretou no cinema uma personagem vivida no teatro pela Marieta Severo, com quem  contracena no filme. A Marieta é grande em muitos sentidos, não?

Tive a sorte de trabalhar com algumas das atrizes que já admirava, e a Marieta é uma delas. Ela não é somente admirável pela atriz que é, pelo seu posicionamento ideológico, pelos pensamentos que ela tem e defende.

Vocês interpretaram a mesma personagem em épocas diferentes e contracenaram na cena em que as personagens se veem através do espelho…

É bonito aquele momento. A profissão do ator possibilita muito o aprendizado com o outro, e essa troca é boa quando é mútua. Isso vale para o meu trabalho com a Yara também. Ver o outro é algo muito valioso.

No caso da Sarah Kubitscheck, é mais fácil ou difícil interpretar alguém que existiu?

Nesse caso não foi difícil por haver poucos registros sobre ela. Então não foi aberta aquela brecha através da qual o público pode fazer comparações. Quando há esse risco, você precisa se sair muito bem como foi o caso da Andréa (Horta), uma amiga e atriz que admiro, quando interpretou a Elis (Regina). No caso da Sarah, a questão física não teve muita relevância. Mais importante do que ficar parecida com ela era contar a sua história.

Você é hoje é uma atriz madura, de 45 anos. Vou repetir a pergunta feita ao Bruno Mazzeo: até que ponto a proximidade dos 50 anos te fascina ou amedronta?

Hoje me sinto muito mais dona da minha vida e isso foi trazido pela maturidade. Tenho muito mais domínio sobre as minhas escolhas e fazer teatro é uma delas. Nós, mulheres, temos hoje mais informação sobre temas relacionados à maturidade e à menopausa do que tínhamos 30 anos atrás. Tias questões não eram nem discutidas pela sociedade. Há uma série de mulheres com mais de 50 anos que estão aí, trabalhando e procurando se realizar, e isso é muito interessante de ver.

Você leva à cena seu primeiro monólogo e já interpretou grandes papéis. O que falta realizar?

Estou trabalhando num projeto para o cinema a partir do livro “Mantenha fora do alcance do bebê”, da Silvia Gomez. Estamos trabalhando nesse projeto há uns cinco anos, e o roteiro está no segundo tratamento. Fazer cinema no Brasil demora demais e acaba sendo um tremendo exercício de paciência.

Crédito da imagem: Jorge Bispo

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